quinta-feira, 29 de agosto de 2013

AS REFORMAS EDUCACIONAIS DOS ANOS 90

Empregabilidade e equidade social.

Constata-se que os anos noventa foram marcados por reformas educacionais em todos os âmbitos do sistema de ensino, o que tem levado a inferir que esta década só seja comparável à década de 60 em termos das mudanças que ensejou.

As reformas educacionais dos anos 90 trazem como referencia a preocupação com a equidade social e educação para todos. Para melhor compreensão do desenvolvimento do ideário das reformas na educação nesta década é preciso proceder a uma distinção entre três períodos de importantes movimentações no campo educativo.

1 – Educação e desenvolvimento (anos 40 até meados de 70).

Os anos sessenta refletiram no campo educativo as transformações que já vinham ocorrendo em décadas anteriores na vida econômica e social do país. Vários foram os eventos que marcaram essa época, entre eles: a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1961, a transformação dos Colégios Universitários em Faculdades de Educação no início da década e o Primeiro Simpósio Brasileiro da Associação dos Professores de Administração Escolar – ANPAE, também em 1961.

Este período foi marcado pela introdução das idéias Taylor-fordistas no Brasil. Isto resulta na criação do SENAI em 1942, tendo à sua frente o grande industrial Roberto Simonsen, árduo defensor da incorporação dos ensinamentos da “organização científica do trabalho” como forma de superação dos pesados ônus deixados pela Segunda Guerra Mundial.

“Na moderna organização do trabalho, a antiga disciplina, a militar – que só se impunha pelo rigorismo dos feitores carrancudos – é substituída pela disciplina inteligente e consciente – oriunda do conhecimento exato que tem o operário da natureza do seu trabalho e da certeza do justo reconhecimento dos seus esforços.”(IN: Simonsen, 1973:436)

É nesse período que se assiste no Brasil a uma tentativa sem precedentes de modernização da economia através da industrialização, o que exigiu da classe trabalhadora melhores e maiores quesitos educacionais. Desde essa época, a relação entre formação e emprego passa a determinar as políticas educacionais

A influência exercida pelo pensamento econômico atribuía à educação formal o status de investimento seguro, o que mais tarde seria conhecido como Teoria do Capital Humano.

Por essas razões, será desenvolvido um modelo de êxito fundado na grande corporação, ou seja, a possibilidade de ascensão social para as classes trabalhadoras, no momento em questão, repousava na via da grande corporação, do emprego formal e regulamentado

Foram esses anos que consolidaram o esgotamento da possibilidade de êxito através da pequena propriedade. Isto se deu a partir do desenvolvimento das grandes corporações, produto do capitalismo monopolista. A educação formal passa a ser considerada como um elevador social 

O vinculo direto entre escolaridade e trabalho, em decorrência da relação educação e desenvolvimento, é forjado a partir daí, o que pode ser percebido no texto da primeira LDB-EM n. 4024, de 1961. Tal relação intensifica-se durante o regime autoritário, que tem lugar no Brasil a partir de 1964, apresentado a educação como investimento produtivo, como ficou expresso na Lei 5692, de 1971.

2 – Educação e Democracia (meados de 70 até final dos 80).

Em decorrência, justamente, da ampliação do direito à educação referida na Lei 5692/71, assiste-se no Brasil, na década de 70 e início dos anos 80, a um redimensionamento jamais visto na rede física de ensino público

O crescimento súbito da estrutura educacional no Brasil de maneira desordenada, pouco planejada e com todos os atropelos característicos das contradições do próprio regime autoritário, combinando elementos de descentralização administrativa previstos na reforma do Estado de 1967, através do decreto n. 200/67, com o planejamento centralizado.

Consolida-se, assim, a organização de um sistema nacional de educação com evidentes traços de autoritarismo e verticalismo na sua gestão. A administração da educação, no referido contexto, passa a ser entendida como atividade racional e burocrática, devendo ser completamente dissociada da política.

A gestão da educação deveria assentar-se no planejamento elaborado por especialistas no assunto. O Instituto Latino-americano de Planejamento Econômico e Social – ILPES, criado no interior da Comissão Econômica para a América Latina e Caribe – CEPAL, tinha como objetivo formar os planejadores e administradores escolares. A escola, assim como o sistema, também deveria se organizar dentro dos pressupostos da chamada “administração científica do trabalho”.

No final da década de 70, com as manifestações políticas que deram origem ao processo de abertura no país e ao surgimento do novo sindicalismo, toma expressão o movimento em defesa da educação pública e gratuita. Esse movimento vai se contrapor à dissociação existente entre planejamento econômico e social. Os segmentos sociais organizados em defesa da escola pública e gratuita, extensiva a todos, vão denunciar o caráter centralizado dos planejamentos globais que refletem o padrão autoritário de política estatal.

Tal reivindicação será conhecida como a defesa do acesso e permanência na escola. Para tanto, seria necessário combater o caráter excludente da instituição escolar que além de muito restritiva no acesso (a inexistência de vagas para todos), ainda dificultava a permanência da maioria através do uso de formas autoritárias de ensino e avaliação. Essas formas, denominadas de cultura da repetência, impediam que muitos conseguissem concluir sua trajetória escolar.

Uma gestão democrática da educação, que reconhecesse a escola como espaço de política e trabalho, era buscada nos emblemas de autonomia administrativa, financeira e pedagógica; participação da comunidade nos desígnios da escola (elaboração dos projetos pedagógicos e definição dos calendários) e a criação de instâncias mais democráticas de gestão (eleição de diretores e constituição dos colegiados).

A Constituição Federal de 1988 consolida muitas dessas conquistas à medida em que reconhece a necessidade de ampliação da educação básica, incluindo agora a educação infantil, ensino fundamental e médio, abarcando, ainda, a gestão democrática. Em relação aos direitos dos trabalhadores da educação pública, a Carta Magna de 1988 também dispõe sobre a liberdade dos mesmos se organizarem em sindicatos.

A principal característica desse processo foi a discussão do direito a igualdade. Se a educação do ponto de vista econômico era imprescindível para o desenvolvimento do país, do ponto de vista social era reclamada como a possibilidade de acesso das classes populares a melhores condições de vida e trabalho. Essa dupla abordagem talvez tenha forjado a construção de uma nova orientação para as reformas educativas dos anos noventa.

3 – Educação e eqüidade social (anos 90).

Em março de 1990 é realizada, em Jomtien, a Conferência Mundial Sobre Educação Para Todos, propondo maior eqüidade social nos países mais pobres e populosos do mundo. O Brasil, sendo signatário desta Conferência, procurou implementar reformas nos seus sistemas públicos de educação básica em consonância com os princípios da mesma. O Plano Decenal de Educação, assinado em dezembro de 1993, é a expressão primeira desse esforço. Alguns autores consideram que este nunca tenha saído do papel.

O traço mais marcante dessa Conferência será a construção de um consenso em torno de uma educação para todos com eqüidade social. Tais orientações buscam mediar as duas referências anteriores: uma educação que responda às exigências do setor produtivo (gestão do trabalho) e outra que atenda às demandas da maioria (gestão da pobreza).

O termo eqüidade refere-se à disposição de reconhecer o direito de cada um, mesmo que isso implique em não obedecer exatamente ao direito objetivo, pautando-se sempre pela busca de justiça e moderação. Esse entendimento do termo sempre esteve presente nas políticas educacionais brasileiras. Entretanto, não parece ser essa a conotação atribuída à eqüidade social no atual momento.

Este conceito, da forma como aparece nos estudos produzidos pelos Organismos Internacionais ligados à ONU e promotores da Conferência de Jomtien, sugere a possibilidade de estender certos benefícios obtidos por alguns grupos sociais à totalidade das populações, sem contudo, ampliar na mesma proporção as despesas públicas para esse fim. Nesse sentido, educação com eqüidade implica o mínimo de instrução indispensável às populações para sua inserção na sociedade atual.

Essa concepção difere radicalmente das motivações da defesa pela educação contida nas referências anteriores. No alvorecer dos anos noventa, uma nova orientação será cunhada. A educação básica reveste-se de caráter profissional com as mudanças no processo produtivo. As exigências de perfil profissional mais flexível e adaptável recaem para uma formação calcada não mais em saberes específicos, mas em novos modelos de competência.

Por fim, as orientações para as reformas educacionais nos anos 90 resguardam a possibilidade de continuar a formar força de trabalho para as demandas do setor produtivo, e no lugar da igualdade de direitos oferecem a eqüidade social, entendida como a capacidade de estender para todos o que se gastava só com alguns. O Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério – FUNDEF parece refletir exatamente esta lógica.

Finalmente, partindo da constatação de que o mercado de trabalho, na economias globalizadas , vem apresentando um aumento significativo do emprego precário, uma queda generalizada dos salários, um aumento do trabalho informal e uma crescente taxa de desemprego é necessário discutir o recente conceito de empregabilidade como um termo criado mais para encobrir que para explicar essa realidade.

Esse conceito que refere-se mais à capacidade dos trabalhadores se manterem empregados ou encontrar novos empregos, quando demitidos, a partir de suas possibilidades de resposta às exigências de maiores requisitos de qualificação demandados pelas mudanças tecnológicas do processo produtivo. Necessita ser questionado pela raiz.



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